sábado, 31 de agosto de 2019

Crime é uma fórmula não uma substância

Nas primeiras aulas de Direito penal, o professor pergunta ao aluno sobre o significado de “crime” e recebe uma resposta que pouco tem a ver com a maneira com que “crime” é definido pelos especialistas da área. Algum tempo depois, a mesma questão será respondida pelo mesmo aluno de forma tecnicamente apropriada, mas distante do uso diário desse conceito.  Jornalistas, políticos, policiais, mas mesmo sociólogos, criminólogos, filósofos e outros profissionais que refletem sobre o tema parecem prescindir e mesmo desdenhar da maneira normativa, artificiosa e rebuscada da definição técnica de crime, enquanto os penalistas parecem aceitar tais críticas com a condescendência cínica de quem está sendo incompreendido e não se importa com isso.
O conceito cotidiano de crime, enquanto uma atitude pessoal flagrantemente imoral, injustificável, capaz de resultar em prejuízo, sofrimento ou morte às suas vítimas, relaciona-se com a idéia acertada de que seu significado deve estar associado a comportamentos humanos danosos, evitáveis e que contrariem as noções habituais do agir corretamente. No Direito penal, as definições de crime pensadas a partir de seus requisitos substanciais (gravidade e relevância social do dano, por exemplo) são chamadas de concepções materiais de crime.  Nessas, há uma busca dos requisitos essenciais que deveriam apresentar quaisquer condutas humanas que a lei defina como crime. Tais requisitos, conforme o autor, época e ideologia, têm variado desde a exigência de que a conduta criminosa seja fonte de flagrante repulsa social, passando pela exigência de que apresente risco potencial à sobrevivência do grupo, chegando até a concepção contemporânea, em que se defende ser a criminalização de determinadas condutas uma forma de garantir que bens, crenças e pessoas possam realizar suas funções sociais dentro do referencial de garantia constitucional.      
Mas, sobretudo nas sociedades complexas, em que há uma pluralidade de noções do que é certo ou errado, bem ou mal, não é fácil, ou seguro, ancorar a definição de crime, e suas poderosas consequências (prisão, segregação, estigma), às voláteis definições de comportamentos socialmente aceitáveis ou intoleráveis. E mesmo as violações a bens jurídicos constitucionalmente protegidos 2, como ataques à vida, à dignidade e à liberdade humana, não são capazes de informar por simples derivação lógica, com a clareza requerida, o contorno exato da conduta criminalmente punível. Não sendo raro os casos de dúvida acerca do que protege a Constituição (v.g. topless é um direito?) e em que medida deva ser protegido (v.g. quais limites da liberdade de expressão?).
    Por essa razão, o conceito de crime conforme utilizado pelos juristas é um conceito formal que, com uma ou outra variação, repousa na fórmula positivista: “é crime o que uma lei válida diz ser crime3.” Em outras palavras, não é tanto pela substância de uma conduta que se interrogará acerca de seu caráter criminoso, mas sim pelo fato de tal conduta cumprir determinados requisitos de forma: coincidir com exatidão (quanto a comportamentos, pensamentos, circunstâncias e resultados) com o texto descrito como proibido pela lei penal. Assim, comete um crime o maior de 18 anos que, com consciência e liberdade, entra em um restaurante e serve-se da comida, sem que tenha meios para pagá-la. Mas não comete crime nenhum aquele que, também maior, com liberdade e consciência, sentou-se no mesmo restaurante, comeu a mesma comida, possuía dinheiro, mas se negou a pagar (esse poderá vir a ser demandado por dívida, mas não por crime!)4.    
Não obstante, pensar sobre o crime como uma categoria formal tem trazido inúmeros problemas para os estudantes de Direito.  A começar pelo fato de que seus contornos terem sido desenhados com requisitos abstratos e de difícil verificação real (como o ânimo do agente no momento do crime) – fazendo com que a aplicação da lei ao caso pareça muitas vezes uma discussão esotérica, deslocada do conflito social que a suscitou (como um homicídio ou uma fraude).  Ademais, aceitar que crime é tão somente uma fórmula legal aplicável a qualquer conduta que a lei assim classificar, presume certo grau de conformismo com as lacunas axiológicas do sistema penal, ou seja, com a existência formal de normas penais que quando aplicadas trazem mais injustiça do que justiça, como a do exemplo do restaurante acima mencionado 5. Em síntese, o formalismo do conceito de crime, como apresentado nos livros-texto da disciplina, parece conferir exatidão e sofisticação conceitual à disciplina, mas esconde sua natureza aberta e controvertida.
  Crime é fato típico, ilícito e culpável, dirá a maior parte dos professores de Direito penal, significando algo como: uma ação ou omissão a que se estava, pela lei penal, proibido de praticar, sob ameaça de pena, realizada com dolo ou, excepcionalmente, com culpa, fora do abrigo de circunstâncias especiais que a tornariam lícita e, além disso, praticada de maneira indesculpável por um sujeito maior de 18 anos. Assim, é crime a conduta que a lei penal diz ser crime (do homicídio à qualquer coisa), quando realizada com as condições subjetivas requeridas pelo tipo (dolo ou culpa). Mas tal conduta deixa de ser crime se lhe falta ilicitude6 (como na legítima defesa) e, pelo menos, deixa de merecer pena, se o sujeito era, pelas razões excepcionais previstas em lei, incapaz de compreender o que fazia (como em um surto psicótico) ou de fazer o que a lei lhe exigia (como numa coação moral irresistível) 7.
Cada um desses elementos (tipicidade, ilicitude e culpabilidade), assim como muitos outros pressupostos neles (conduta, nexo causal, dolo, culpa etc.) são objeto de questionamentos e controvérsias nos tribunais, nas universidades, nos livros e nos pedidos de revisão de prova dos doutos acadêmicos de Direito. Compreender os componentes centrais da classificação legal de crime é indispensável, mas também carregado de dificuldades, entre outras coisas porque tal conceito é apenas parte de um contexto mais amplo do discurso jurídico-penal. Vejamos alguns pontos desse contexto discursivo.

II. O contexto discursivo do conceito de crime
Primeiramente, o ponto central da definição formal de crime é sua alegada qualidade pública. De forma esquemática, uma lesão que afete principalmente direitos e obrigações pertencentes apenas a indivíduos determinados é objeto da lei civil, como um prejuízo financeiro, uma quebra de contrato ou disputas sobre direitos de propriedade. O crime é diferenciável pelo fato de a lesão dele resultante ser dirigida à própria sociedade.  Assim, em tese, o roubo é uma ofensa antes às leis do Estado que o proíbem do que à vítima que foi desapossada violentamente de seus pertences8.  Para complicar a situação, a mesma lesão pode ser matéria de julgamento na esfera criminal e na esfera civil.  Por exemplo, o mesmo roubo é, ao mesmo tempo, um prejuízo individual e um crime; e uma quebra de contrato pode conter um crime, como um estelionato.  Afora essas sobreposições, é importante ter alguns parâmetros para diferenciar as transgressões à lei que podem render uma disputa civil, uma disputa criminal ou ambas.
A responsabilidade civil decorre, fundamentalmente, do dano (material ou imaterial) que alguém tenha causado a outrem, enquanto que a responsabilidade criminal decorre, de modo geral, da voluntariedade de uma conduta realizada, de sua culpabilidade e, apenas subsidiariamente, do dano causado9.  E se nos danos civis a ação judicial é promovida contra seu causador pela própria vítima, nas lesões penais cabe ao Estado processar o perpetrador da lesão. Essa é a regra geral em nosso Direito penal: acusar alguém de um crime é uma tarefa do Estado, realizada por meio de seus órgãos de acusação (membros do Ministério Público Estadual ou Federal), havendo, entretanto, exceções em que o processamento do acusado deve ser conduzido pela própria vítima, ou seu representante, valendo-se dos serviços de um advogado público ou privado10. Um sério problema da caracterização do crime como uma lesão pública é que isso é pouco informativo. Crime é aquilo que a lei define como crime. Mas essa definição não nos informa como e por que se chegou à conclusão de que esta ou aquela lesão é meramente privada e aquela outra é um crime, isso é, de interesse público. Não é simples explicar a alguém que comprar uma mercadoria com cheque “sem fundos” é crime, mas comprá-la no crediário e não pagá-la é apenas um ilícito civil, de quebra de um contrato.  Não há uma regra segura que determine as características requeridas a uma lesão para ela ter relevância pública ou simplesmente privada. Isso tem sido uma escolha mais ou menos arbitrária do legislador federal, a partir de suas concepções acerca dos comportamentos merecedores de regulação criminal. Dessa maneira, a vida do feto anencéfalo está dentro do âmbito de proteção criminal, mas não a do feto resultante de estupro, que é suplantada pela proteção à liberdade de decisão da gestante acerca do destino da gravidez resultante do crime.
Uma segunda faceta da definição formal de delito é que cada crime deve estar previsto em estatutos legais claramente especificados. Todo crime consiste de uma conduta humana (comissiva ou omissiva) prevista em lei penal e, a menos que seja um crime de responsabilidade objetiva11, acompanhada de um determinado estado mental: dolo ou culpa. A ação ou omissão, suas consequências e circunstâncias dão materialidade ao crime; e o estado mental do acusado, no momento do crime (isto é, seu dolo ou culpa), marca seu elemento subjetivo. E tanto a materialidade quanto o elemento subjetivo do crime precisam ser demonstrados pela acusação já que, como a inocência do réu é presumida, é o Estado-acusador que deve arcar com o ônus da prova.  Assim, um crime só é cometido se houver uma conduta dolosa ou culposa12; de afronta à lei penal e se tal conduta, junto ao seu dolo ou culpa, forem provados para além de qualquer dúvida razoável13.
  Por evidente que os juristas são atraídos por essa definição formal do crime, enquanto conduta estritamente prevista em lei e cometida sob determinado estado mental. Com efeito, isso transmite segurança, permitindo que as pessoas se dirijam ao seu trabalho e lazer, na crença de que se o sistema penal funcionar por seus princípios, não haverá punições arbitrárias14. Tal definição formal ainda possibilita que quem pratique um crime saiba qual a punição específica deverá receber, pois a lei transgredida, e sua respectiva previsão de pena, sempre tem que ter surgido antes da conduta transgressora (princípio da anterioridade da lei penal incriminadora15).
A série de exigências formais das leis penais torna, então, impróprio atribuir a alguém o estigma de criminoso até que haja prova definitiva de sua culpa no sistema judicial, mediante um processo com ampla possibilidade de defesa. Por tal razão, não há de se falar em criminosos na fase da investigação policial e mesmo durante o processo criminal, assim como não há, até o fim definitivo do processo, de falar-se em vítimas de crime: o status de criminoso, e de vítima, só pode aparecer, formalmente, após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória. Até esse momento, só há “suposto criminoso” e “suposta vítima do autor” 16.
Como um conceito prático, entretanto, as exigências formais esboçadas acima são problemáticas. Razão pela qual o status de criminoso é atribuído pela sociedade ao acusado muito antes de um processo penal ter chegado a tal conclusão. Isso é compreensível, pois se só ao final do processo criminal há crimes e criminosos, não existem crimes não apurados ou por apurar, pois, formalmente, o crime é algo “criado” a partir do seu reconhecimento definitivo pelo Estado-juiz. Com isso se pode chegar à bizarra conclusão de que quem produz o crime é o próprio Estado, e que para baixar seus índices basta haver menos leis e processos penais condenatórios!
Outro aspecto relacionado, é que o ideário legal exige atributos como objetividade, ausência de distorções político-ideológicas e autonomia tanto no momento de criar a lei penal, quanto no momento de aplicá-la ao suposto criminoso. Mas uma visão crítica das doutrinas jurídicas permite que o estudante perceba que há ideologias distorcendo o sistema legal e processual-penal, levando-o para determinados e estranhos resultados. Assim, a imputação da condição de criminoso ao usuário de drogas, por exemplo, reflete não um valor consensual e objetivo da sociedade acerca de seus perigos, mas uma ideologia de parte da sociedade traduzida em lei17. Da mesma forma, o fato de a imensa maioria da população encarcerada ser oriunda das classes pobres indica que as leis, a investigação policial e o processo-penal não são insensíveis a questões de dinheiro e poder.
 Independentemente de suas distorções ideológicas, recorrer à lei penal e aos tribunais, com suas algemas e prisões, é uma forma brutal de equacionar conflitos sociais. Nem todos os crimes implicam violência, mas a aplicação da lei penal traz em si uma violência intrínseca, daí a importância de princípios como o da mínima intervenção do Direito penal18. O Direito penal, no plano interno, deve ser visto como a guerra no plano internacional: como a última ratio, a razão que resta quando tudo mais fracassou. Motivo pelo qual equacionar questões simples (como xingamentos e injúrias) ou polêmicas (como o aborto e a eutanásia) por meio do Direito penal costuma gerar mais conflitos do que proteção. O que não quer dizer que tais condutas não precisem de regulamentação jurídica, mas certamente não de regulamentação criminal.
Outro ponto revelador da complexidade do formalismo da definição de crime diz respeito ao fato de que sua apuração exige uma série de procedimentos sui generis em matéria da descoberta/construção da “verdade” processual-penal . As regras de evidência, o padrão de provas aceitáveis, as regras de competência do juízo e o devido processo legal são intrínsecos à própria constituição formal do crime. A verdade processual-penal não é a verdade obtida a qualquer preço, mas a verdade formal, limitada pelas provas aceitáveis, prazos, direitos de silêncio, prerrogativas de sigilo e outras que limitam o encontro da “verdade real dos fatos” em favor de uma verdade construída dentro de certas limitações legais, éticas e de preservação da dignidade humana.   
 A exigência de que a acusação prove sua tese para além de qualquer dúvida razoável, isto é: que derrube a presunção de inocência do acusado; assim como a adoção do sistema adversarial ou acusatório (aquele no qual acusação e defesa possuem o mesmo poder de apresentar e questionar provas, bem como de influenciar legitimamente nos rumos do processo, enquanto o juiz deve permanecer imparcial, para decidir a causa de acordo com sua livre convicção19), assim como direitos intrínsecos da defesa, como permanecer em silêncio, recusar-se a produzir provas contra si mesmo ou a possibilidade de revisar, sempre e apenas em seu benefício, um processo condenatório que já haja transitado em julgado, são elementos distintivos da justiça penal.
 Compreendido dessa maneira, o crime pode ser definido como o resultado de um processo criminal: sem processamento e condenação isenta de dúvida não pode haver responsabilização criminal. Entretanto, o crime entendido como resultado de um processo penal condenatório válido é de fato aplicável?
III     Os equívocos práticos dos conceitos penais
Para os estudantes de Direito, um dos problemas básicos das definições formais de crime é que elas não parecem se materializar na prática diária de policiais, advogados, promotores, juízes e imprensa. Por certo que as definições legais não devem nos impedir de enxergar variações, distorções morais e ideológicas em sua aplicação. Assim, como não se deve perder de vista a distância entre a lei que cria uma regra, que deve ser seguida, e o tratamento ordinário dos fatos criminais, que podem ou não estar adequados às regras determinadas pela lei. O papel esperado do operador do Direito, nesse sentido, é que reduza tal discrepância, no sentido da estrita observação das garantias e restrições legais à incriminação válida do acusado.
Sem tal consciência, os livros e aulas de Direito penal parecem tratar de algo esotérico, meramente intelectual e sem ressonância na vida prática da sociedade. As discussões sobrenexo de causalidade, dolo e culpa, provas lícitas e ilícitas, ausência de dúvida razoável, muitas vezes, na prática, têm sido apenas precariamente observadas. Da mesma forma, é preciso evidenciar que os estilos de pensamento criminal são construídos (desde a faculdade), principalmente, em crimes tradicionalmente tidos como sérios (como homicídio, roubo e estupro), dedicando pouca atenção à maioria dos crimes previstos em lei, que não envolvem ameaça ou violência direta a pessoas. O resultado dessa superatenção aos crimes de violência é a manutenção do ideário de que o crime é algo que só pode ser combatido com prisão e medidas extremas, impondo uma violência (como a prisão e os tratamentos sub-humanos nos “depósitos de presos”), inclusive a pessoas que jamais praticaram violência ou grave ameaça contra outro ser humano: como no caso dos crimes de perigo abstrato (como portar uma arma de fogo não registrada para defesa própria), nos delitos insignificantes (como o furto de um xampu no supermercado) ou, ainda, nos crimes culposos.
Ainda há de se considerar o impacto da definição formal de crime nas estatísticas criminais. Se nossas forças policiais e autoridades de segurança concentrarem sua atenção no conceito formal de crime, aparecerá o curioso resultado de que o número de crimes praticados em uma sociedade é igual ao número de pessoas condenadas por tais crimes. Ora, como só existe crime e criminoso após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, não existem crimes não descobertos, crimes não elucidados ou não julgados. Isso daria às nossas autoridades de segurança um índice de 100% de eficácia! O que certamente contraria a sensação de insegurança cotidiana.
Isso faz com que o uso do conceito de crime pelo Estado, pela imprensa e mesmo pelos estudiosos do fenômeno criminal (os criminólogos) seja diferente daquele usado exclusivamente na justiça processual-penal.  Assim, as estatísticas oficiais de crime são, em rigor, estatísticas de suspeita de crimes. E os criminólogos costumam analisar a definição formal de crime, mas não se submetem a ela. Ao contrário, criticam, por vezes, a dissonância entre tal definição e as expectativas sociais, o caráter político e discriminatório de várias definições de crimes específicos, assim como também as variáveis sociais que fazem com que uma ação ou omissão que, em princípio, constitui uma quebra da lei penal seja de fato considerada crime e seu autor, efetivamente, responsabilizado pelo sistema judicial. 
Entre as variáveis que intervém no fato de uma pessoa ser ou não formalmente criminosa, destacam-se contingências como classe social, cor da pele, gênero, ocupação, visibilidade da transgressão, maior ou menor poder da vítima atingida e mesmo a sorte. Por certo que tais variáveis não integram a definição formal dos crimes, mas orientam, como um código penal e processual-penal subterrâneo, o destino prático do acusado.
Assim, a definição formal de crime, com suas garantias e pressupostos, é um conceito útil e mesmo indispensável à configuração legal de um crime, mas não se aplica a todas as situações em que as expressões “crime” e “criminoso” são utilizadas na sociedade. Por isso, deve o estudante de Direito acostumar-se com tal ambiguidade para aplicar o sentido devido a cada situação. O crime do Direito penal é uma conduta que afronta uma lei penal de forma voluntária, sem justificativas válidas pelo sistema jurídico (isto é, antijurídica), cometida por uma pessoa com a idade mínima requerida e que, no momento da ação ou omissão, era capaz de compreender o que fazia e, ainda, que podia ter agido de acordo com a lei. Enquanto que o crime, no modo como é comumente utilizado pela sociedade, é a prática de uma conduta avaliada como intolerável violação de direitos alheios, praticada por um ser perigoso, e que merece uma punição, quase sempre a privação de sua liberdade.
O Direito penal não está estruturado para lidar com seres perigosos, mas com seres culpados. Razão pela qual a lei penal é reativa: primeiro o crime, depois a pena (e não a pena para evitar o crime). E embora haja algumas medidas chamadas preventivas (prisões e cautelas durante o curso do processo) é a confirmação do réu enquanto culpado definitivo que permitirá que ele receba qualquer restrição que não seja apenas uma aposta provisória contra sua presunção de inocência20.
Não interessa o quão mau alguém seja, ou o quão perigoso pareça, até que cometa um crime e seja por ele condenado, a inocência integra sua personalidade. Pode parecer que isso deriva de um sistema absurdo de garantias individuais em detrimento da sociedade, mas, a história é testemunha,de que o inverso é que tem sido a regra: punir por suspeita, extorquir provas e confissões do acusado e trocar a justiça pública pela vingança exercida pelos agentes públicos.  Um sistema menos formalista é o que a maioria das pessoas costuma reinvidicar para combater o crime alheio, mas  é em tais formalidades que se refugiarão tão-logo caiam nas suspeitas oficiais. E mais vale dar garantias formais a todos, ainda que isso torne o sistema lento, do que trocá-las, como não é raro ocorrer, por um sistema de privilégios a apenas alguns poucos poderosos que, da trincheira de sua imunidade, chamam de abusivas as garantias formais alheias.

Em conclusão, os conceitos formais do Direito penal são úteis se tomados como uma garantia do cidadão de que o Estado terá que seguir vários passos e provar vários elementos se quiser condenar alguém. Mas são inúteis se forem tomados como indicadores seguros do nível de violência social ou para indicarem as causas do crime. Assim, os condenados não são necessariamente os que transgrediram a lei penal e, se transgrediram, não são os únicos que, pelos mesmos critérios, deveriam estar condenados. Como todo conceito formal, o rótulo de criminoso pode ser utilizado para perseguir alguns e privilegiar outros. 
O Direito pode ser dogmático, pondo um valor transcendental às suas leis e métodos de incriminação, mas seus praticantes não devem seguir o mesmo caminho. Os arsenais de poder simbólico e material concentrados na disputa pelos diversos empregos da expressão crime e criminoso (pelos tribunais, polícia, imprensa, universidades etc.) e suas respectivas consequências, que em comum têm apenas o fato de reafirmarem a força do Estado para excluir socialmente determinadas pessoas, nada têm de inocente. Mas pensado em sua dimensão crítica, o Direito penal, com suas exigências formais e principiológicas, pode ser convertido em uma forma de restringir a sanha punitiva do Estado; uma pedra no caminho do linchamento e uma a menos na mão dos linchadores.

Bibliografia:
ANDRADE, V. R. P. Sistema penal máximo x cidadania mínima. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.
ASHWORTH, A. Principles of criminal law. Oxford: OUP, 2003.
BATISTA, N. e ZAFFARONI, E. R. Direito penal brasileiro I. Rio de Janeiro: Revan, 2003.
FERRAJOLI, L. Direito e razão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
ROXIN, C. Derecho penal: parte general. Madrid: Thomson, 1997.
ZAFFARONI, E. R. Hacia um realismo jurídico penal marginal? Caracas: Monte Avila, 2003.
ZEDNER, L.  Criminal justice.  Oxford: OUP, 2005.

Pastor Silas Malafaia – a besta profana dos evangélicos e suas ofensas homossexuais

A bíblia só apresenta duas bestas, descritas mitologicamente no Apocalipse. Este livro do Novo Testamento é o que mais causa calafrios entre os cristãos, suas imaginações não conseguem acompanhar tanta ficção narradas ao longo dos 22 capítulos que sentencia o mundo. Uma das bestas no mundo atual é o Edir Macedo, que chamei da besta que veio da terra, eis que outra besta vinda também da terra, que já há algum tempo causa alarde no meio evangélico brasileiro, ostenta – além dos chifres – uma boca profanadora de mentiras, ilusões e charlatanismo que caem como próteses aos mutilados do povo de Deus. – Pastor Silas Malafaia. Você já deve ter visto esse figura por ai.
Além de apresentador do programa “Vitória em Cristo” exibido na Band, Silas Malafaia é Jesus Cristo ainda não pregado na cruz entre os grupos homossexuais. Isso porque o falastrão não se contentou em pregar mentiras apenas ao público religioso e tratou logo de apresentar seu ódio racista aos homossexuais. –
Ótima manobra dos controladores de massas, joga uma faísca em meio à pólvora e aguarda o fogo apagar para assumir uma posição de destaque maior entre os evangélicos que, sendo a massa, e vendo seu principal líder ser crucificado na sociedade, tratam logo de colocá-lo em um trono ainda maior.
As religiões não engoliram a perda do poder político, seus líderes se sentem detentores da verdade. As inúmeras guerras causadas em nome de Deus deixaram de ser feitas por espadas e cavaleiros. Agora elas atacam verbalmente através de conteúdos racistas e xenófobos.
No Velho Testamento Deus é uma máquina de matar e castigar, ao longo dos seus 39 livros são descritas muitas guerras entre povos, sacrifícios e inferiorização dos animais, inferiorização da mulher, escravidão, intolerâncias, atrocidades, contradições e outros inúmeros disparates.
No Novo Testamento Deus já é mais piedoso, continua matando, escravizando, inferiorizando e separando povos, mas aqui ele te oferece a chance do perdão. Ao todo, esse livro fúnebre do terror legitima as ações e motivações religiosas.
Passada a época onde se derramava sangue aos que se recusassem a se converter, os discursos religiosos em relação aos diferentes, seja por raça, costume ou religião, é a falácia de que eles ainda não sabem da verdade. O cristão vê o católico como aquele que está no caminho errado sem saber, e vice-versa.
Como toda religião se agrega e se solidifica através das massas, quanto maior o número de fiéis, mais fácil se torna a veiculação dos ensinamentos e maior o seu alcance. Se antes a igreja católica precisava de cavalaria e armas para fazer valer suas doutrinas, hoje, basta um anúncio do papa para alterar o comportamento e ações de seus fiéis.
Nesse sentido, os evangélicos que não tinham grande visibilidade no país, hoje absorvem cada vez mais os desesperados em busca das palavras que afagam seus ouvidos. Os meios de difusão de suas doutrinas ampliaram, além de contarem com departamentos específicos compostos por profissionais perversos que utilizam de manobras de controle.
Nesse contexto, a negação dos homossexuais por parte do pastor Silas Malafaia causou um furor entre os representantes do grupo e acirrou ainda mais os preconceitos.
Um dos “recantos evangélicos” mostra, através dos comentários verificados, o quanto isso favorece a discriminação. Percebe-se ali, uma legitimação da atitude do pastor através das “escrituras sagradas”. – Ora pois, se na bíblia está escrito que Deus fez o homem para a mulher e a mulher para o homem, logo, o pastor é santo, e os anormais que se queimem no inferno. Infelizmente, como se já não bastasse a realidade social do nosso país que já é repleta de contradições e discriminações, somos obrigados a vivenciar fatos desse tipo que facilmente poderiam ser evitados.
Guardem esse nome, pastor Silas Malafaia. Besta que se desponta rapidamente no cenário da fábrica de ilusões às custas do dízimo e da cegueira social. É a principal estrela dos evangélicos, assume um semblante de sujeito falastrão e com jocosidade de causar risos entre os evangélicos, mas vergonha aos outros.
É um sujeito astuto, logra muito bem os artifícios de controle e manipulação das massas. Seu principal alvo é destronar o Edir Macedo, por isso suas charlatanices não irão permanecer apenas entre as quatro paredes do meio evangélico.
Esse safado ainda vai causar muita polêmica…

FONTE .. CETICISMO.NET

sexta-feira, 30 de agosto de 2019

Para descontrair!


Esses meus braços
Eles estão solitários
Solitários e se sentindo para baixo
Esses meus braços
Eles estão com saudades
Saudades por querer você

E se você
Deixasse-os te segurar
Oh, como eu ficarei grato

Esses meus braços
Eles estão sofrendo
Sofrendo por te querer
Esses meus braços
Eles estão querendo
Querendo te segurar

E se você
Deixasse-os te segurar
Oh, como eu ficarei grato

Venha, meu bem, venha
Aceite ser minha mulher (sim)
Aceite ser meu amor, eu preciso de alguém
(Alguém) Que me trate bem
Oh, eu preciso que seus braços amorosos me segurem forte
E preciso dos seus lábios cheios de ternura também
Me segure, me segure

Magistrado faz sentença em linguagem coloquial para combater 'juridiquês'

bit.ly/30ArhNr | O mundo das leis não precisa ser um universo indecifrável. Para provar isso, um magistrado gaúcho redigiu uma sentença trocando o tom pomposo do Direito pela linguagem do dia a dia. O resultado foi um texto de fácil compreensão e uma repercussão maior do que ele imaginava: virou notícia no meio jurídico — e fora dele.

A ideia surgiu quando João Batista de Matos Danda, então juiz do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, viu-se completamente perdido em uma conversa com a filha. Por mensagem, a jovem contava sobre um novo emprego, na área do marketing.

— Ela escreveu expressões como "startup", "incubada", "transmídia", "DNA de marca". Aí, eu perguntei: "minha filha, o que tu estás falando exatamente? Traduz, por favor" — conta Danda, ainda achando graça do papo que não lhe fez sentido.

Ao se dar conta de que a linguagem técnica acaba restringindo o entendimento a poucos, geralmente aqueles que trabalham na mesma área, o juiz, então, se propôs ser mais claro em suas decisões — desafio que levou com certo exagero em abril passado, quando foi relator no processo em que o pedreiro Lucas de Oliveira pedia vínculo de emprego e indenização por danos morais, após sofrer acidente em uma obra particular, de propriedade de Itamar Carboni.

Danda foi direto na explicação do rolo. "Três meses depois de iniciada a obra, o pedreiro caiu da sacada, um pouco por falta de sorte, outro pouco por falta de cuidado, porque ele não tinha e não usava equipamento de proteção. Ele, Itamar, ficou com pena e acabou pagando até o serviço que o operário ainda não tinha terminado", disse o juiz na sentença.

Lá pelas tantas do acórdão, ao falar do processo de revisão da sentença, o magistrado soltou essa: "para julgar de novo, vou ler as declarações de todos mais uma vez e olhar os documentos. Pode ser que me convença do contrário. Mas pode ser que não. Vamos ver".

É um texto tão coloquial que parece não ter nada de mais, certo? Errado. O próprio juiz conta como normalmente essa ideia seria escrita, em um processo "normal":

— Inconformado com a sentença, que julgou improcedente a ação, recorre o reclamante buscando sua reforma quanto ao vínculo de emprego e indenização por acidente de trabalho. Com contrarrazões sobem os autos a este tribunal. É o relatório. Passo a decidir.

Na decisão, Danda defendeu que não havia vínculo de emprego na situação, mas que isso não impedia o trabalhador de receber indenização por danos morais. A reparação, segundo o juiz, "serve para amenizar um pouco o sofrimento de Lucas, mas também serve para Itamar lembrar que tem obrigação de cuidar da segurança daqueles que trabalham na sua casa, mesmo quando não são empregados".

Leia a íntegra da sentença do juiz Danda


Ponderou ainda que o valor da indenização "não pode ser tão pesado que vire um inferno para seu Itamar pagar; nem muito pouco, porque aí ele paga sem problemas e não se importa se amanhã ou depois outro acidente acontece em sua casa".

Por outro lado, esclareceu Danda, o pedreiro "não pode pretender ficar rico com a tragédia; mas também o dinheiro tem que fazer alguma diferença na sua vida". Então fixou o pagamento de R$ 7 mil, além da pensão mensal vitalícia de R$ 281,25.

Nesta semana, Danda foi empossado desembargador. Segundo ele, a tentativa de simplificar as decisões deve continuar, agora, no novo posto:

— Na maioria das vezes, é difícil fugir dos jargões, mas é uma tendência fazer sentenças mais claras. Sem perder a precisão técnica, claro.

"Rebimbocas da parafuseta" também aparecem em outras áreas

Falar difícil não é exclusividade do Direito. Cada área do conhecimento, aliás, tem a sua linguagem própria, seus termos técnicos. Quem é que nunca ficou com um ponto de interrogação na testa ouvindo mediquês, academiquês, economês..? É complicado.

Sem dúvida. Mas pode ser útil. Para Pedro Garcez, professor de linguística na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), pode ser uma estratégia que agiliza a comunicação dentro de um grupo. Vale ressaltar: dentro de um grupo.

— Há boas razões para existirem linguagens especializadas. É uma facilitação para quem está cotidianamente trabalhando determinado discurso. Mas há textos que, mesmo vindos de uma área técnica, deveriam ser compreensíveis ao grande público — pondera.

Como exemplo, o professor cita os termos de consentimento (documento assinado pelo paciente, autorizando o médico a realizar determinado procedimento). Uma pesquisa da Bioética, realizada no Hospital de Clínicas de Porto Alegre, mostrou que para compreender os documentos era necessário ter mais de 11 anos de escolaridade — sendo que a média de tempo de estudo dos atendidos na instituição era de seis anos.

Para superar o problema, foram criados manuais que ajudam a redigir os termos de um jeito mais simples. Assim, dispepsia virou má digestão — bem mais fácil de engolir. O mesmo ocorreu com as bulas, que por determinação de uma lei, tornaram-se mais compreensíveis.

Só que falar difícil também pode ser um propósito, principalmente quando se deseja passar seriedade. A história conta que Freud passou um perrengue por causa disso. O criador da psicanálise teria escrito seus trabalhos em alemão coloquial, com o objetivo de torná-los um conhecimento popular.

Quando seus estudos chegaram aos Estados Unidos, no entanto, foram traduzidos em conceitos mais fechados, que dariam uma aparência mais científica. Freud ficou um pouco mais difícil por isso. Como linguagem é poder, um repertório mais empolado pode selecionar um público e tornar outro refém.

— Uma das grandes funções é impedir que o leigo tenha acesso a um conhecimento. Se eu levar meu carro no mecânico, e ele me disser que tem de trocar a rebimboca da parafuseta, não vou entender nada. E ele pode até me cobrar mais caro, porque eu não sei do que se trata — exemplifica Patrícia Reuillard, professora da UFRGS que atua na área de terminologia.

Ficou claro?

Fonte: Zh Clicrbs

Juíza manda soltar presos com base em decisão do ministro Dias Toffoli sobre Coaf

bit.ly/2MLaX9p | A juíza Sílvia Maria Rocha, da 2ª Vara Federal Criminal de São Paulo, decidiu soltar dois presos e suspender parte da Operação Descarte. A investigação mira suspeitas de um esquema de corrupção que fez desvios milionários por meio de contratos falsos com empresas públicas, principalmente nos estados de São Paulo e Minas Gerais.

A justificativa é que, na origem da investigação, houve compartilhamento de informações fiscais pela Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), sem autorização judicial.

O despacho da juíza segue decisão de 15 de julho do presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), José Antônio Dias Toffoli, que determinou a suspensão de investigações criminais pelo país que usem dados detalhados de órgãos de controle -como Coaf, Receita Federal e Banco Central- sem aval da Justiça.

O plenário do Supremo deverá analisar a questão em novembro.

A juíza mandou soltar os dois únicos presos da operação, o advogado Luiz Carlos D´Afonseca Claro e seu filho, Gabriel Claro.

Eles são réus sob acusação de corrupção ativa, passiva e lavagem de dinheiro.

Nesta quarta (28), o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) já havia suspendido atos processuais referentes a um dos alvos da operação, o ex-presidente da Estre Ambiental Wilson Quintella, pelo mesmo motivo. Silvia Maria Rocha estendeu a decisão a outros alvos.

A operação, feita de forma conjunta entre Ministério Público Federal, Polícia Federal e Receita, avançou sobre episódios que também já foram citados nas delações da Odebrecht e da JBS.

Com seis fases, a Descarte já firmou oito acordos de delação premiada, que devem render repasses de R$ 15 milhões aos cofres públicos.

O procurador da República Vicente Mandetta, responsável pela operação, afirma que a suspensão "representa principalmente um grande contratempo, pois prejudica o ritmo da Operação Descarte, que já se encontrava na 6ª fase e que teria novas diligências pela frente".

"Esperamos, contudo, que essa decisão seja revertida pelo próprio TRF (Tribunal Regional Federal) numa análise mais detalhada", diz Mandetta. "Estamos trabalhando em contato com a Procuradoria Regional da República e um recurso será proposto dentro do prazo".

Com a primeira fase deflagrada em março de 2018, a Descarte teve como base suspeitas de um esquema de lavagem de dinheiro comandado por Luiz Carlos Claro.

A primeira fase explorou empresas de serviços de limpeza que têm contratos públicos. A segunda, a Chiaroscuro, teve como alvo Guilherme Paulus, fundador da empresa de turismo CVC.

Mais tarde, ele confessou ter pago propina para livrar uma de suas empresas (que não é a CVC) de uma cobrança de R$ 161 milhões em tributos.

A operação avançou, no entanto, para políticos e aliados. Nas fases denominadas "E o Vento Levou" 1, 2 e 3, de abril e julho, investigou contrato supostamente superfaturado em R$ 40 milhões de energia eólica da Renova Energia S.A, firma que havia recebido mais de R$ 800 milhões aportes da Cemig, com a empresa Casa dos Ventos.

Esse valor teria sido distribuído a aliados dos ex-governadores de MG Aécio Neves (PSDB), hoje deputado federal, e Fernando Pimentel (PT).

No âmbito da operação, foi quebrado o sigilo telefônico de Pimentel.

Um delator foi essencial para os avanços da investigação sobre políticos mineiros: Ricardo Assaf, ex-diretor financeiro da Renova.

Procurados, os advogados de Wilson Quintella, Pierpaolo Bottini e Aldo Romani Netto, afirmam em nota que "a Operação Descarte teve como base informações bancárias obtidas sem autorização judicial". "

É prudente que investigações dessa natureza sejam suspensas enquanto o STF não decidir se tais provas são válidas ou não", disseram os advogados.

A defesa dos Claro não irá se manifestar.

Por Wálter Nunes José Marques (FOLHAPRESS)
Fonte: www.otempo.com.br

Competência dos Juízados Especiais cíveis.

Resumo:
Os Juizados Especiais, disciplinados constitucionalmente no artigo 98, inciso I da Constituição Federal foram instituídos pela Lei 9.099/95, e possuem competência para conciliação, processo e julgamento das causas cíveis de menor complexidade, assim definidas: as causas cujo valor não exceda a quarenta vezes o salário mínimo federal; as enumeradas no artigo 275, incido II do Código de Processo Civil, ou seja, as ações de rito sumário; ação de despejo para uso próprio, considerando como uso próprio também para o cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente que não possua imóvel próprio; as ações possessórias sobre bens imóveis de valor não excedente a quarenta vezes o salário mínimo. Ainda é competente para promover a execução dos seus julgados, considerando as sentenças proferidas, os acordos celebrados em seu âmbito, os acordos extrajudicialmente firmados e homologados nos juizados especiais cíveis e dos títulos executivos extrajudiciais no valor de até quarenta vezes o salário mínimo. O legislador utilizou dois critérios para definir a competência dos juizados, sendo eles, qualitativo que diz respeito à matéria do objeto, e o critério quantitativo que diz respeito ao valor da controvérsia. No entanto, não basta a simples fixação desses dois fatores para delimitar a competência do Juizado Especial Cível, eles devem ser interpretados juntamente com o caput do artigo  da Lei 9.099/95 e com artigo 98, inciso I da Constituição Federal.
Palavras chaves: Juizado Especial Cível; Lei 9.099/95, Competência.
1 INTRODUÇÃO
O objetivo do trabalho é interpretar o artigo  da lei 9.099/95, que regula os Juizados Especiais Cíveis e Criminais Estaduais, assim aos demais artigos da referida Lei e o artigo 98, inciso I da Constituição Federal, definir quais são as causas em que este órgão pode ser demandado para solucionar as adversidades da sociedade.
O Juizado Especial Cível representa um sistema que aproxima a tutela jurisdicional do cidadão, que busca a celeridade e a efetividade do processo, trazendo consigo a intenção de possibilitar a satisfação psicológica nas pessoas em relação ao acesso à justiça. Por isso, sua atuação deve sempre agir conforme os princípios norteados deste sistema, dispostos no artigo  da Lei 9.099/95, sendo eles: oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, visando, sobretudo, a conciliação entre os litigantes.
Primeiramente, pretende-se expor um breve relato sobre a evolução histórica dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais, trazendo alguns aspectos em comparação com os Juizados Especiais de Pequenas Causas que eram disciplinados pela Lei 7.244/84.
Em seguida, a finalidade e apresentar suas peculiaridades, discussões doutrinárias e jurisprudenciais da competência material, elencada em cada inciso do artigo  da Lei 9.099/95, tais como, as enunciadas no artigo 275, inciso II do Código de Processo Civil, ou seja, as causas em que seguem o rito sumário, as ações de despejo para uso próprio, ações possessórias sobre bens imóveis que não excedam o limite de alçada e por fim, a competência para promover a execução de títulos judicias e extrajudiciais.
Posteriormente, realizadas as considerações de causas em que o Juizado Especial Cível não poderá ser demandado, seja em razão da matéria em que será tratada na lide ou em função da pessoa que figurará o polo passivo da ação.
2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS
O Juizado Especial de Pequenas Causas foi implantado em 07 de novembro de 1984, pela lei Ordinária nº 7.244 que dispôs sobre a criação e funcionamento desse órgão.
Em seu artigo 1º, trazia em seu bojo, a afirmação de que sua criação era facultativa e se daria nos Estados, no Distrito Federal e nos territórios. Apresentava também o caráter facultativo de o autor da lide utilizar-se ou não deste procedimento nas causas de reduzido valor econômico, disposições esta que não está presente na Lei dos Juizados Especiais Civeis e Criminais Estaduais, tema que será abordado no item 3.1 deste trabalho.
Com relação à competência em razão do valor da justa causa, o limite de alçada dos Juizados Especiais de Pequenas Causas era de 20 (vinte) vezes o salário vigente no país (artigo , da lei 7.244/84), já nos Juizados Especiais Cíveis Estaduais, este limite é de 40 (quarenta) vezes o valor do salário mínimo federal (artigo , inciso I, da Lei 9.099/95), sendo que nas causas de até 20 (vinte) vezes este valor, o acompanhamento das partes por advogado será facultativo.
Pode-se concluir que a finalidade de ambos é a busca pela garantia do acesso à justiça, atendendo assim, ao direito fundamental.
Em 27 de setembro de 1995 foi publicada a Lei 9.099 que trata sobre os Juizados Especiais Cíveis E Criminais Estaduais, que entrou em vigor 60 (sessenta) dias após esta data. Em seu artigo revogou expressamente a Lei 7.244/84, portanto, podemos dizer que o Juizados Especiais Cível e Criminal Estadual é um suplente ao antigo Juizado Especial de Pequenas Causas.
2.1 O JUIZADO ESPECIAL CÍVEL NO BRASIL
Roldão e Algomiro explicam como se deu o surgimento dos Juizados Especiais no Brasil:
De há muito, o Brasil vem se ressentindo de uma justiça mais rápida e, sobretudo, descomplicada para que se dê atendimento às camadas mais humildes da população. Ainda na década de oitenta (80), o então Ministro da Desburocratização HÉLIO BELTRÃO encerou movimento no sentido de tornar as coisas mais simples neste país, em todos os sentidos.
E foi assim que, pensando em oferecer uma justiça mais rápida, simplificada, eficiente e, mais que isso, gratuita, inspirado nas SMALL CLAIM COURTS dos Estados Unidos da América do Norte e ainda nas Cortes de Conciliação CHOTEI do Japão, criou o primeiro instrumento para esse desiderato, no que tange à Justiça.
Foi elaborado anteprojeto de Lei por Juristas do Rio Grande do Sul, São Paulo e Brasília que fez com que viesse a lume a Lei nº 7.244 de 07 de novembro de 1984, criando os Juizados Especiais de Pequenas Causas, órgãos da Justiça Ordinária, para processo e julgamento por opção do autor, das causas de reduzido valor econômico.
Na feliz observação do magistrado goiano VÌTOR BARBOZA LENZA, o objetivo dessa Lei (hoje revogada) foi o ato de atrair para a justiça as causas que ela não estavam tendo acesso, e também desafogar a Justiça, sobretudo nas varas de Procedimentos Sumaríssimo e Assistência Judiciária. Hoje, com o advento da Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, criam-se os Juizados Especiais Cíveis e Criminais (CARVALHO; CARVALHO NETO, 2006, P. 39-40).
Como exemplos de pioneirismo em instituir os “Juizados Especiais Cíveis” citamos os Estados de Santa Catarina, por meio das Leis nº 8.151/1990 e 8.271/1991; Mato Grosso do Sul, por meio da Lei nº 1.071/1990; Rio Grande do Sul, por meio das Leis nº 8.124/1986 e 9.442/1991; e São Paulo, por meio da Lei nº 5.143/1986. É importante ressaltar que, todas essas Leis Estaduais foram revogadas ou readaptadas com o advento da Lei Ordinária Federal nº 9.099/1995, nos termos de seu artigo 97.
Atualmente, no Brasil temos os juizados especiais cíveis e criminais, tanto na esfera Estadual quanto na esfera Federal.
3 O PROBLEMA DA DELIMITAÇÃO INICIAL DA COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS ESTADUAIS
3.1 NATUREZA OPTATIVA OU OBRIGATÓRIA DO JUIZADO?
Os Juizados Especiais Cíveis Estaduais possuem competência para conciliação, processo e julgamento das causas de menor complexidade assim definidas no artigo  da Lei nº 9.099/95. No entanto, um ponto em que surge divergência é com relação à opção ou obrigatoriedade desse procedimento, já que a Lei não prevê este aspecto. Assim nos mostra os ensinamentos de Alvim:
Logo que promulgada a Lei 9.099/95, surgiu duvidas sobre se a competência dos juizados especiais seria absoluta ou relativa, ou seja, se a parte autora poderia optar pela justiça comum nas hipóteses em que se essa lei estabelecida a competência do juízo dos juizados especiais; mas, sendo relativa, essa opção pela Justiça comum constituída verdadeiro direito postetativo, cujos efeitos são produzidos pela simples emissão de vontade do seu titular (2008, p 25).
Nos Juizados Especiais de Pequenas Causas, havia previsão no artigo 1º (Lei nº 7.244/84) de que era facultativa ao autor a opção pelo procedimento descrito na referida Lei, vejamos:
Lei nº 7.244/84 (revogada) – Art.  - Os Juizados Especiais de Pequenas Causas, órgãos da Justiça ordinária, poderão ser criados nos Estados, no Distrito Federal e nos Territórios, para processo e julgamento, por opção do autor, das causas de reduzido valor econômico. (grifo nosso)
Já na Lei nº 10.259/01 que regula os Juizados Especiais Federais, existe a previsão de que onde houver instalada Vara do Juizado Especial, a competência será absoluta, conforme § 3º do artigo 3º.
Lei nº 10.259/01 – Art.  Compete ao Juizado Especial Federal Cível processar, conciliar e julgar causas de competência da Justiça Federal até o valor de sessenta salários mínimos, bem como executar as sentenças.
§ 3º No foro onde estiver instalada Vara do Juizado Especial, a sua competência é absoluta. (grifo nosso)
Para melhor elucidar o entendimento, vejamos o conceito de competência definido por Vicente Greco Filho.
É o poder de fazer atuar a jurisdição que tem um órgão jurisdicional diante de um caso concreto. Decorre esse poder de uma delimitação prévia, constitucional e legal, estabelecida, segundo critérios de especialização da Justiça, distribuição territorial e divisão de serviços (1993/1995) apud, LOURENÇO, 1998, p. 39).
Do mesmo modo, doutrinadores defendem a corrente de que o procedimento é de natureza optiva, tal como é o entendimento sustentado por Cândido Rangel Dinamarco:
A crença de que o Juizado especial cível seja obrigatório para o autor, sem possibilidade de optar entre ele e os órgãos comuns da jurisdição, é acima de tudo resultado da desconsideração de que o processo que ali se faz não se distingue do comum apenas procedimentos, que ali se faz não se distingue do comum apenas pelo procedimentos. Negar que o sujeito possa renunciar ao Juizado, mediante invocação da regra de irrenunciabilidade do rito (CPC, artigo 295, inciso V), é esquecer algo de implantado pela legislação. Mediante esse novo processo, os Juizados preparam e ministram uma tutela jurisdicional diferenciada (...). O processo do Juizado, como ficou anotado de início, é composto de uma fórmula diferenciada entre os sujeitos litigantes e o Estado que exerce a jurisdição – e diferenciada com os dois objetivos fundamentais que são o de prover uma justiça participativa e aderente à realidade e de fazê-lo com extrema rapidez. Nesse quadro, o autor que opta pelo processo novo (...) de certo modo renuncia a possibilidades que só no processo comum encontraria, particularmente no tocante aos caminhos probatórios, que no processo dos Juizados é mais estreito (...). Não se trata, portanto, de renunciar ao rito, o que seria realmente inadmissível mas de optar entre duas espécies de processos (1996 apud, LOURENÇO, p. 40-41, 1998). (grifo nosso)
Os procedimentos do Juizados, deveriam ser de forma facultativa, competente ao autor decidir se gostaria de ingressar com ação em um sistema mais célere, porém com as possibilidades de recursos bem menores do que comparados as outras varas.
3.2 CAUSAS CÍVEIS DE MENOR COMPLEXIDADE
No artigo 3 º da Referida Lei, temos a delimitação da competência material deste ente, ou seja, em quais causas os Juizados Especiais Cíveis serão competentes para julgar as demandas, sendo determinada pelos seguintes critérios: “O Juizado Especial Cível tem competência para conciliação, processo e julgamento das causas cíveis de menor complexidade, assim consideradas”
O grande problema em interpretar este dispositivo, é que a norma é repleta de conceitos abertos, cuja interpretação acaba por ser subjetiva, tendo em vista a não previsão em nossa normatização, assim é o que nos traz Alvim:
A expressão “menor complexidade”, além de ser um conceito fluido é, igualmente, indeterminado, pois os seus limites dependem da ótica do julgador, o que faz com que, na prática, o que um juiz considera pouco complexo, outro considere muito complexo, e um preserve, e o outro não, a sua competência (2008, p. 27).
Além do critério em razão do objeto (menor complexidade), o legislador também se utilizou do critério quantitativo, previsto no inciso I do artigo 3º (valor de até 40 salários mínimos), para definir a alçada dos Juizados Especiais Cíveis.
No entanto, não há que confundir o valor da causa com complexidade. Isso porque, podemos ter causa cujo valor seja inferior ao máximo previsto na Lei e que exija dilação probatória pericial para solucionar a lide.
Assim nos ensinam Tourinho Neto e Figueira Júnior:
Contudo, não há que se confundir pequeno valor com reduzida complexidade do litígio, seja em termos fáticos ou jurídicos. Nada obsta que estejamos diante de uma ação que não ultrapasse quarenta salários mínimos, mas que, em contrapartida, apresenta questões jurídicas de alta indagação, não raras as vezes acrescidas da necessidade de produção de intrincada produção de prova pericial (2005, p. 109).
O entendimento doutrinário acima demonstra que os critérios quantitativos (em razão do valor) e de menor complexidade, não podem ser confundidos.
Com relação ao critério de menor complexidade, o problema de interpretação está presente no caput do artigo 3º que traz em seu bojo a previsão de que o Juizado Especial Cível é competente para processar e julgar as causas de menor complexidade, porém, a determinação do que são causas de menor complexidade fica a cargo da doutrina e da jurisprudência.
3.3 CAUSAS CÍVEIS DE ATÉ 40 SALÁRIOS MÍNIMOS
O critério quantitativo definidor da competência do Juizado Especial Cível possui grande relevância perante vários fatores, vejamos a lição de Tourinho Neto e Figueira Júnior:
A matéria pertinente ao valor da causa assume em nossas sistemáticas normativa instrumental vigente papel importantíssimo, a começar pela petição inicial, na qual figura como um de seus elementos indisponíveis, além das várias implicações de ordem pública, tendo-se consideração que estabelece o tipo de procedimento adequado, fixa a competência originária e recursal, serve de base para o cálculo e depósito das custas processuais, é parâmetro, em algumas hipóteses, para a fixação de honorários advocatícios (no caso de sucumbência em segunda instância), limite a produção de prova exclusivamente testemunhal e serve, como padrão para a fixação da multa e indenização quando reconhecida a litigância de má-fé e por prática de ato atentatório ao exercício da jurisdição.
[...] Todavia, como já aduzimos em itens precedentes, ao postulante compete realizar a escolha do rito que melhor venha se adequar à sua pretensão, inclusive levar em conta a complexidade da demanda, o que pode significar a necessidade de produção de prova pericial (o que é incompatível com a Lei 9.099/1995) ou, ainda, a exigência de citação editalícia (também inadmissível nos juizados).
No entanto, existem peculiaridades a este requisito de competência. Sendo a demanda de valor até vinte vezes o salário mínimo Federal vigente, é dispensado o acompanhamento por advogado, contudo, se ultrapassar este teto a presença do mesmo será obrigatória, facultando ao autor a renúncia ao crédito excedente ou a conciliação nos casos em que ultrapassar o limite de alçada.
4 CAUSAS INCLUÍDAS NA COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS ESTADUAIS
4.1 CAUSAS ENUNCIADAS NO ARTIGO 275
O inciso II do artigo  da lei 9.099/95, prevê que os Juizados são competentes para julgar as causas elencadas no inciso II do artigo 275 do Código de Processo Civil.
Art. 275. Observa-se-á o procedimento sumário:
II – nas causas, qualquer que seja o valor:
a) De arrendamento rural e de parceria agrícola;
b) De cobrança ao condômino de quaisquer quantias devidas ao condomínio;
c) De ressarcimento por danos em prédio urbano ou rústico;
d) De ressarcimento por danos causados em acidente de veículo de via terrestre;
e) De cobrança de seguro, relativamente aos danos causados em acidente de veículo, ressalvados os casos de processos de execução;
f) De cobrança de honorários dos profissionais liberais, ressalvando o disposto em legislação especial;
g) Que versem sobre revogação de doação
h) Nos demais casos previstos em lei.
5 CASOS NÃO COMPETENTES AOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS ESTADUAIS
De acordo com § 2º do art.  da Lei 9.099/95, ficam excluídas da competência dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais as seguintes causas:
§ 2º Ficam excluídas da competência do Juizado Especial às causas de natureza alimentar, falimentar, fiscal e de interesse da Fazenda Pública, e também as relativas a acidentes de trabalho, a resíduos e ao estado e capacidade das pessoas, ainda que cunho patrimonial.
Sobre as causas expressas de incompetência dos Juizados Especiais Cíveis Estaduais leciona Figueira Júnior:
Seja em razão da natureza de algumas matérias ou em face das características particulares de algumas das partes litigantes, o que por si só faz exigir uma cognição mais ampla e, portanto, compatível com um procedimento sem sumarização, estão previamente excluídas da competência dos Juizados Especiais as demandas de natureza alimentar, fiscal ou tributária e todas aquelas de interesse da Fazenda pública (seja Estadual, Federal ou municipal), bem como as relativas a acidentes de trabalho, a resíduos e ao estado e a capacidade das pessoas, ainda que de cunho patrimonial.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do presente estudo, podemos concluir que o Juizado Especial Cível Estadual, instituído pela Lei 9.099/95, é um sucessor do antigo Juizado Especial de Pequenas Causas que era disciplinado pela Lei 7.244/84.
Por meio de uma análise comparativa, concluímos que o Juizado Especial Cível Estadual não só sucedeu o Juizado Especial de Pequenas Causas, como teve ampliada sua competência. Algumas diferenças entre a competência dos dois procedimentos chamam atenção, tais como: o Juizado Especial de Pequenas Causas tinha como limite de alçada o valor de 20 (vinte) vezes o valor do salário mínimo federal, diferentemente do Juizados Especial Cível, cuja a limitação quantitativa é de 40 (quarenta) vezes este valor, observando a assistência por advogado nas causas excedentes ao valor estipulado conforme artigo  da Lei 9.099/95 quer seja 20 (vinte) vezes o salário mínimo federal, advertindo que o valor da causa será atribuído o valor de acordo com a pretensão econômica objeto do pedido. Além da diferença do limite de valor, percebemos que o rol de causas que eram descritas no artigo 3º da antiga Lei e do mesmo artigo na nova Lei, foi ampliado pelo legislador. Ressaltasse ainda que a competência do artigo 3º no que concerne ao termo “menor complexidade” utilizado pelo legislador, a doutrina e a jurisprudência entendem que a complexidade não se mede pelo direito em si pleiteado, e sim pela maneira em que será demonstrado, ou seja, definimos o que são causas complexas pelo objeto da prova.
Desde a implantação dos Juizados Especiais, surgiu questionamento no sentido deste procedimento ser de competência relativa ou absoluta, já que o texto legal não traz nenhuma disposição a respeito. Travadas discussões doutrinárias, concluísse que este procedimento tem competência relativa, ou seja, cabe ao autor optar pelo rito disposto na Lei 9.099/95 ou pela justiça comum ordinária. Embora alguns doutrinadores ainda defendam o caráter absoluto, a corrente majoritária entende ser facultativo.
No que cabem as causas enunciadas no inciso II do artigo 275 do Código de Processo Civil existe discussão sobre a obrigatoriedade ou não de respeitar o limite valorativo de alçada, qual seja quarenta salários mínimos. A corrente majoritária entende que as causas constantes no referido dispositivo não precisam atender a limitação valorativa do inciso I do artigo  da Lei 9.099/95.
Sobre as questões de incompetência, trazidas pela própria lei, sejam elas em razão de sua natureza ou em virtude das partes envolvidas. Dentre estas circunstanciais destacamos que o Juizado Especial Cível, não é competente para aquelas ações de natureza alimentar, falimentar, fiscal relativa a resíduos, acidente de trabalho, de interesse da Fazenda Pública, e ao estado de capacidade das pessoas, ainda que de cunho patrimonial, assim com em que figurem como quaisquer das partes na forma do artigo  da lei 9.099/95, o incapaz, o preso, as pessoas jurídicas de direito público, as empresas públicas da União, a massa falida e o insolvente civil.
Por fim há que se concluir que embora o Juizado Especial Cível estadual represente um avanço quanto ao acesso à justiça, há que se ressalvar a importância da interpretação da competência deste ente, observando os princípios que o norteiam, para que não seja utilizado simplesmente com intuito de desafogar a justiça comum fugindo assim de sua finalidade que é a garantia constitucional de prestação jurisdicional célere e efetiva ao cidadão.
REFERÊNCIAS
Lei 7.244/1984 – Dispõe sobre a criação e o funcionamento do Juizado Especial de Pequenas Causas.
Lei 9.099/1995 – Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências.
Lei 10.259/2001 – Dispõe sobre a instituição dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal.
ALVIN, J. E. C. Juizados Especiais Cíveis Estaduais. 4 ed. Curitiba: Juruá, 2008.
CARVALHO, R. O. De; CARVALHO NETO, A Juizados Especiais Cíveis e criminais: Doutrina, Prática e legislação. 4, ed. Anápolis: Bestbook, 2006.
DINAMARCO, C. R. Manual dos Juizados Cíveis. 2. Ed. São Paulo: Malheiros, 2001.
LOURENÇO, L. A. G. Juizados Especiais Cíveis: legislação, doutrina, jurisprudência e prática. 1. Ed. São Paulo: Iglu, 1998.
TOURINHO NETO, F. DA C.; FIGUEIRA JÚNIOR, J. D. Juizados Especiais Estaduais Cíveis e Criminais: Comentários à Lei 9.099/95. Ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2005.
FIGUEIRA JÚNIOR, J. D.; LOPES, M. A. R. Comentários à lei dos Juizados Especiais Civeis e Criminais2. Ed. São Paulo: Revistas dos tribunais.